26.1.12

Alcântara Machado

Antônio Castilho de Alcântara Machado d'Oliveira nasceu em São Paulo, a 25 de maio de 1901, filho de ilustre e tradicional família paulistana. Formou-se em Direito pela Faculdade do Largo São Francisco. Apesar de colaborar periodicamente com artigos sobre cultura no Jornal do Comércio, só tomou contato direto com os modernistas de São Paulo a partir de 1925. Sua estréia literária se deu em 1926, com um livro de crônicas intitulado Pathé-Baby, com prefácio de Oswald de Andrade. Em 1928, participou ativamente da primeira "dentição" da Revista de Antropofagia; após 1929, por divergências ideológicas, afastou-se de Oswald, ao mesmo tempo que estreitou laços de amizade com Mário de Andrade. Morreu em 14 de abril de 1935, em São Paulo, aos 34 anos de idade.
Alcântara Machado teve seu nome definitivamente consagrado com a publicação dos livros de contos Brás, Bexiga e Barra Funda (1927) e Laranja da China (1928). A maior característica de sua obra está no retrato, ao mesmo tempo crítico, anedótico, apaixonado, mas sobretudo humano, que faz da cidade de São Paulo e de seu povo, com particular atenção para os imigrantes italianos, quer os moradores de bairros mais pobres, quer os que se vão aburguesando. Todo esse painel é narrado no verdadeiro dialeto paulistano resultante da mistura do linguajar do imigrante italiano com o falar do povo brasileiro, que se convencionou chamar de "português macarrônico", já brilhantemente utilizado por Juó Bananére. Em Brás, Bexiga e Barra Funda, o autor define seus contos como "notícias" e o livro como um "jornal - órgão dos ítalo-brasileiros de São Paulo".
Transcrevemos, a seguir, um trecho do "editorial" desse "jornal".
"Do consórcio da gente imigrante com o ambiente, do consórcio da gente imigrante com a indígena nasceram os novos mamalucos.
Nasceram os intalianinhos.
O Gaetaninho.
A Carmela.
Brasileiros e paulistas. Até bandeirantes.
E o colosso continuou rolando.
No começo a arrogância indígena perguntou meio zangada:
Carcamano pé-de-chumbo
Calcanhar de frigideira
Quem te deu a confiança
De casar com brasileira?
O pé-de-chumbo poderia responder tirando o cachimbo da boca e cuspindo de lado: A brasileira, per Bacco! Mas não disse nada. Adaptou-se. Trabalhou. Integrou-se. Prosperou.
E o negro violeiro cantou assim:
Italiano grita
Brasileiro fala
Viva o Brasil
E a bandeira da Itália!
Brás, Bexiga e Barra Funda, como membro da livre imprensa que é, tenta fixar tão somente alguns aspectos da vida trabalhadeira, íntima e quotidiana desses novos mestiços nacionais e nacionalistas. É um jornal. Mais nada. Notícia. Só. Não tem partido nem ideal. Não comenta. Não discute. Não aprofunda.
Principalmente não aprofunda. Em suas colunas não se encontra uma única linha de doutrina. Tudo são fatos diversos. Acontecimentos de crônica urbana. Episódios de rua. O aspecto étnico-social dessa novíssima raça de gigantes encontrará amanhã o seu historiador. E será então analisado e pesado num livro.
Brás, Bexiga e Barra Funda não é um livro.
Inscrevendo em sua coluna de honra os nomes de alguns ítalo-brasileiros ilustres este jornal rende uma homenagem à força e às virtudes da nova fornada mamaluca. São nomes de literatos, jornalistas, cientistas, políticos, esportistas, artistas e industriais. Todos eles figuram entre os que impulsionam e nobilitam neste momento a vida espiritual e material de São Paulo.
Brás, Bexiga e Barra Funda não é uma sátira."